sábado, 26 de março de 2011

do fumo



Esta semana, Alberto Gonçalves fala de tabaco na Sábado.
Eu fumo charutos praticamente desde que me casei, vai para catorze anos. Não teve a ver com o casamento, apenas com a minha saída de casa: o meu irmão, ainda hoje quando visita a minha mãe, não fuma dentro de casa. Uma coisa chamada respeito, que caiu em desuso mas que há quem ainda cultive.
Durante a sua vida, o meu pai fumou esporádicamente charutos, cachimbo e cigarrilhas. Herdei-lhe duas características nesse campo: nunca cedeu ao vício e tinha sempre uma lata de cigarrilhas no carro. Ele Café Creme, eu mini Montecristo (sinal dos tempos ou das disponibilidades financeiras ou da vaidade).
Sempre me inebriou o aroma do tabaco, mas tirando uma época breve em que fumei Português Suave sem filtro enquanto estudei no Porto, nunca me rendi aos cigarros.
Em contrapartida o cachimbo (que experimentei e abandonei por simplesmente não saber fumar) e os charutos, exercem sobre mim um fascínio que ultrapassa os limites do sensato. Quando trabalhei no Palace do Bussaco, ficava com as caixas vazias de cedro dos Montecristos apenas para poder inalar aqueles aromas - durante anos guardei todas as caixas de charutos que fumei.
Um dia decidi-me. 
E à bruta!
Comprei uma caixa de Romeo e Julieta tubos em Espanha: experimentei o primeiro após uma jantarada farta e opulenta e consegui fumar metade. É uma bitola excessiva para iniciados: um charuto para Homens. Mas nem correu mal. Alguns dias passados, fumei outro...
Semanas depois fui convidado para um almoço volante na Escola de Hotelaria de Coimbra, comi pouquito porque simplesmente abomino comer com o prato na mão e no final sentei-me no bar para um café e dois dedos de conversa com o meu amigo Jorge Costa, à época ainda director da instituição. Acendi um charuto e comecei o ritual: apanhei aquela que se pode apelidar como a mãe de todas as pedradas. Levantei-me o mais discretamente que pude, fui à casa de banho, lancei o parco almoço às águas do Mondego, saí tão discretamente quanto as circunstâncias me permitiram, encostei o carro no parque de estacionamento do Coimbra Shopping, abri as janelas e dormi toda a santa tarde.
Durante quase meio ano não voltei a tocar em charutos.
Um belo dia recomecei. Fiz alguma pesquisa, comprei bitolas e marcas mais suaves (a Elsa ofereceu-me um belíssimo "humidor"), iniciei-me nos fabulosos Fonsecas (embrulhados em delicioso papel de seda), pelo meio meti uns Montecristos nº4, uns panetelas Avo ou Davidoff para contrabalançar, uns puritos H Upmann e alguns produtos da Fábrica de Tabacos Estrela que produz em Ponta Delgada alguns dos melhores Puros que se enrolam na Europa: Beldina, Coroa, Meia Coroa e Coroa Real. E comprei um isqueiro Dupont próprio para o efeito que por acaso saltou de avaria em avaria até morrer ingloriamente dentro de uma chávena de café.
Ah! E uns Cohibas: de Siglos vários ou Exquisitos, excessivamente caros para o prazer que proprocionam.
Durante alguns anos rotinei: um Quintero depois do almoço em passeio pela Baixa de Coimbra ou um Meia Coroa no gabinete no hotel até ser proibido. 
Hoje, e porque me provoca arritmias, moderei. Em média um Quintero por semana e nas grandes ocasiões um Montecristo nº4. No carro continua a caixa das cigarrilhas Montecristo, intocável desde que lá foi plantada.
Apenas pelo prazer, guardo em stock no "humidor" robustos Cohiba, Montecristos A, Montecristos nº2 e mais umas coisas avulsas. É a minha caixa das joias.
Nunca me deixei vencer pelo vício. Diminuí e algumas vezes parei e nunca senti mais que saudade. 
Fumo por puro deleite e conforme consegui antever (na época nunca tinha fumado) numa crónica que um dia escrevi no extinto "Jornal de Coimbra" do meu amigo Jorge Castilho, deixei de os invejar tão somente porque hoje sou um daqueles privilegiados que conseguem "extrair prazeres supremos de coisas tão simples como admirar espirais de fumo".     

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